sábado, 4 de fevereiro de 2012

Enrolada...


Enrolava. Uma mecha de cada vez. Sem pressa. Era dia de colocar em prática uma das suas principais características. En-ro-lar. Até falava devagar, quase se orgulhando, mas sabia das vantagens e desvantagens de tal verbo. Não por acaso, adorava a frase "temos todo o tempo do mundo..." de uma de suas músicas preferidas, ironicamente chamada "Tempo perdido". Perdia tempo, mas não se importava em adiar a arrumação dos livros jogados na cama. Alguns até dormiam com ela. Enrolava pra amar, porque achava necessário e importante. Gostava de escrever em terceira pessoa sobre si mesma porque achava que o impacto era menor. Se enrolava entre linhas. Se enrolava entre espaços ou falta de. Fisicamente, ficava de conchinha e interiormente se escondia como caracol. Enrolava a verdade, mas não mentia... era só falta de coragem de encarar as consequências de deixar pra depois. Enrolava. Enrolava a linha, pra costurar corações; a fita da sapatilha, pra conseguir se equilbrar; a fita de rádio que herdou dá avó, pra sentir. Enrolava pra escrever porque na última hora é sempre quando todos os sentimentos não tem medo de aparecer. Achava sincero. Mais uma mecha de cabelo. Pensava enroladamente nele. Bem devagar pra o sentimento ser sustentado até o final. Enrolada na toalha fazia uma declaração de amor ao vento. Cobria a alma e se enrolava de proteção, através de muita oração. Proteção. Pura reticências, tinha sempre algo a ser dito e algo que não foi dito. Enrolava as palavras. Enrolou o beijo, deixou durar. Enrolou a saudade e confundiram com embrulho de presente. Presente quase grego, enrolou o elogio... não por não gostar, mas por  avaliar cuidadosamente o quanto gostou e saber qual será o tom de voz pro "muito obrigada". Enrolava todas ligações do mundo, porque odiava falar ao telefone, mas se esforçava pra melhorar. Tudo devagar e ainda tinha coisa que passava despercebido. Enrolava a "desculpa" porque essa era difícil de sair de dentro da alma sinceramente. Mas uma coisa sobre a menina enrolada era certa: tinha o maior cuidado em não enrolar as pessoas. Segundo ela, só pode se enrolar  pessoas em abraços apertados e gigantes, sejam duplos, triplos ou infinitos. Enrolar pessoas não parecia justo. Talvez por isso, depois de tanta enrola, ela queria mesmo era dizer: "não me deixa enrolada". E no papel enrolado no bolso, ele encontrou: "Desenrole meus cachos, meu juízo, meu status, minha toalha. Desenrole sua paciência. Desenrole meus segredos. Desenrolo seus desejos. Desenrolemos o tempo..."

2 comentários:

  1. é tão difícil 'desenrolar'...
    o cabelo, a vida, o tempo, os afazeres, os sentimentos, os incômodos, a tristeza, a alegria... seja lá o que for... nunca é fácil desenrolar. pior ainda é ser 'enrolada'. Fato.

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