sábado, 29 de dezembro de 2007

- Sua mãe o mataria se soubesse que está fumando

- disse Laila, olhando para um lado e para o outro antes de entrar no beco.
- Só que ela não sabe - retrucou ele, recuando para deixá-la passar.
- Mas poderia vir a saber.
- E quem vai contar a ela? Você?
- Pode contar seus segredos ao vento, mas depois, não vá culpá-lo por contar tudo às árvores - disse a menina, batendo com o pé no chão.
- Quem disse isso? - indagou Tariq, sorrindo e erguendo a sombrancelha.
- Khalil Gibran.
- Você é uma exibida!
- Me dê um cigarro.
Ele fez que não com a cabeça e cruzou os braços. Este era um novo item do seu repertório de poses: recostado na parede, de braços cruzados, com um cigarro pendendo do canto da boca e a perna boa meio dobrada, com um ar descontraído.
- Por que não?
- Não é legal pra você - disse ele.
- Mas é pra você?
- Faço isso por causa das garotas.
- Que garotas?
- Elas acham sexy - respondeu ele, todo prosa.
- Não é mesmo.
- Não?
- Garanto que não.
- Não é sexy?
- Fica parecendo um khila, um retardado.
- Uau, e precisa ser tão dura? - retrucou ele.
- De qualquer forma que garotas são essas?
- Hmmm, você está com ciúme.
- Eu, não. Não estou nem aí... É só curiosidade.
- As duas coisas ao mesmo tempo? Impossível! - observou ele, dando uma tragada no cigarro e apertando os olhos por causa da fumaça. - Aposto que estão falando de nós.
Laila podia ouvir a voz da mãe, dizendo: "É como segurar mainá. Basta soltar um pouco as mãos e pronto: ele sai voando." Sentiu uma pontada de culpa, mas, depois, calou a voz da mãe e preferiu saborear o jeito como Tariq tinha pronunciado a palavra nós. Era como reconhecer a ligação entre ambos, cristalizá-la.
- Dizendo o quê?
- Que estamos navegando pelo rio do pecado - respondeu ele. - Comendo um pedaço do bolo da imoralidade.
- Andando no riquixá da depravação - acrescentou Laila, entrando na brincadeira.
- Preparando a qurma do sacrilégio.
E os dois caíram na risada. De repente, Tariq notou que o cabelo dela estava crescendo.
- Está bonito - disse ele.
- Você está mudando de assunto - retrucou Laila, torcendo para não ficar vermelha.
- Que assunto?
- Aquelas meninas de cabeça oca que acham você sexy.
- Ora, você sabe muito bem.
- Sei o quê?
- Que só me interesso por você.
Laila se derreteu por dentro. Tentou ler o rosto dele, mas o que viu foi algo indecifrável: aquele sorrisinho cretino e brincalhão que não combinava nada com as pálpebras semicerradas e o olhar meio desesperado. Um arzinho bem esperto, calculado para ficar exatamente a meio caminho entre gozação e a sinceridade.
Então, ele apagou o cigarro com o calcanhar da perna boa.

A cidade do sol.~
(segundo melhor livro do ano!)

Um comentário:

  1. eu também acho (alguns) homens fumando sexy
    hohoho :D
    gostei disso aí :]

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