terça-feira, 11 de setembro de 2012

Gabriele

Gabriele entrou assustada no bar que sempre achou muito bonito e nunca teve oportunidade de ir. Esperou por muito tempo um convite, uma roupa, uma ocasião perfeita, uma comemoração. Decidiu que ia entrar aquele dia mesmo. Sozinha. 23:12, olhou no relógio, só pro caso de precisar escrever depois. Porque apesar de ter tatuado Caio Fernando (e chorar todos os dias por isso) dizendo "Não há nada a ser esperado, nem desesperado", sempre esperava. E desesperava.

Sentou no banquinho do bar, "1930", e decidiu que ia paquerar o garçom. Tinha uma leve atração por garçons. Principalmente garçons novos, tatuados, altos e carecas. Pediu uma bebida chamada "Sex & The City", uma mistura de tequila com coisas gostosas. Bonita e cara. Sentiu falta de um homem pra escolher algo mais forte pra ela. Tocava um som parecido com blues e o garçom nem olhou pros seus olhos. Não se importou. Distraída, brincava com as gotinhas do copo.

Olhou pra cantora. Cabelo meio raspado, voz meio rouca e o resto dos componentes da banda homens charmosos, provavelmente socialistas rebeldes que abandonaram a faculdade. Não entendia mais esse povo e começou a concordar com Criolo: "as pessoas só estão perdidas". A cantora deu uma piscadinha e ela decidiu brincar de gostar. Gostava mesmo era de gente.

21 anos. Primeiro aniversário sozinha. Desligou todos os celulares, não entrou nas redes sociais. Segundo ano na faculdade. Finalmente estava começando ser. Não que fosse muito, mas pelo menos descobriu que era só isso, mesmo. E que nunca ia parar de procurar mais. Cansada. As lágrimas começaram a escorrer sem pedir permissão. 21 anos. Sozinha, num bar.

Intervalo da banda e foi se exibir no piano de cauda no cantinho. Coldplay. Dedos gritaram na tecla e ao terminar, longo sussurro de palmas. Com os olhos embaçados, voltou a se concentrar no outro copo. Coração batendo forte diante tantos desconhecidos. Apreciava a sensação.

Até que ele levantou, sentou-se do seu lado e disse: "Pra quem foi a música?". "Pra mim. Hoje é meu aniversário e Coldplay é uma das minhas bandas preferidas". "Plágio é feio". Bufou. Não gostava muito de quem não gostava de suas bandas prediletas. Sua filosofia era música. Se quer dormir comigo, péssima maneira de abordagem, pensou. Reparou nele e pensou sua irmã dizendo "você tem essa mania de achar feio bonito né... sua cara". Cabelo bagunçadinho, com barba por fazer. Não deu conversa. O menino levantou e foi ao piano.

November rain.

"Essa foi pra você. Hoje é seu aniversário e Guns N' Roses é uma das minhas bandas preferidas."

Com os olhos cheio de lágrimas percebeu que foi o melhor presente da vida dela. Everybody needs somebody. Sorriu e manteve a conversa por 4 horas e  mais um pouquinho. Contou do amor velho, do novo, e do de sempre. Contou sobre as sua teorias malucas e ele riu quando ouviu ela dizer sem parar algo mais ou menos assim: "O que seria o amor se não deitar na grama pra procurar desenho nas nuvens? Ou fazer da pupila do outro um espelho? Ou não aguentar de saudade e quebrar as regras femininas de conquista? Ou ele assistir espetáculo de ballet e ela de luta? Ou fazer nada e achar o silêncio muito bonito? Ou bater de brincadeira usando a desculpa que tapa de amor não dói? Ou isso que faz parecer qualquer coisa/outro imbecil?..."

"Seria sexo. Tem lá suas vantagens também..." E os dois riram como se a noite fosse infinita. E o amor também.

Nascer do sol. Novo ano. Novas conquistas. Novos desejos.

Agradeceu pela noite e se despediu. Beijo lento como em toda cena de amor tranquilo. De pessoa de 21 anos em paz consigo e com os outros.

"Não vai me dar seu telefone?"
"Me dê o seu. Eu te ligo"

Gabriele nunca ligou.

Um comentário:

  1. "Não há nada a ser esperado nem desesperado". E mesmo sabendo disso, sempre esperamos. E nos desesperamos. Mas "a vida é a arte do encontro embora haja tantos desencontros pela vida..." Difícil lidar com esses paradoxos...

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